quarta-feira, 9 de julho de 2014

Não penses meu amor… - Alexander Pushkin

Não penses, meu amor, que no meu seio guardo
O tumultuar do sangue, o frenesi de que ardo,
os uivos dela, os gritos de bacante em cio,
quando, como uma cobra, sob mim se torce,
e em beijos que remordem e na carícia urgente
vem o estertor final da consumada posse.
Mais doce és tu, amor, tão sossegada e calma —
pelo prazer dorido com que eu sou todo alma
quando, após longamente suplicar-te ansioso,
com pudica modéstia cedes ao meu gozo
e a mim te dás enfim, mas desviando o olhar,
aos meus ardor's tão fria e sem me ouvir's falar,
mas despertando… ah quão tu devagar despertas…
até que, a contragosto, o meu prazer é o teu.

A Estrela e O Anjo - Manuel Bandeira

Vésper caiu cheia de pudor na minha cama
Vésper em cuja ardência não havia a
menor parcela de sensualidade

Enquanto eu gritava o seu nome três vezes 
Dois grandes botões de rosa murcharam 

E o meu anjo da guarda quebrou-se de mãos postas no
                                              [desejo insatisfeito de Deus.


                              
                                                                Estrela da Manhã 

terça-feira, 8 de julho de 2014

Flores Murchas - Manuel Bandeira

Pálidas crianças
Mal desabrochadas
Na manhã da vida!
Tristes asiladas
Que pendeis cansadas
Como flores murchas!

Pálidas crianças
Que me recordais
Minhas esperanças!

Pálidas meninas
Sem amor de mãe,
Pálidas meninas
Uniformizadas,
Quem vos arrancara
Dessas vestes tristes
Onde a caridade
Vos amortalhou!

Ai quem vos dissera,
Ai quem vos gritara:
— Anjos debandai!

Mas ninguém vos diz
Nem ninguém vos dá
Mais que o olhar de pena
Quando desfilais,
Açucenas murchas,
Procissão de sombras!

Ao cair da tarde
Vós me recordais
— Oh meninas tristes! —
Minhas esperanças!
Minhas esperanças
— Meninas cansadas,
Pálidas crianças
A quem ninguém diz:
— Anjos, debandai!...

segunda-feira, 7 de julho de 2014

New Moscow - Yuri Pimenov


Mensagem para a Sibéria - Alexander Pushkin

Lá nas minas da Sibéria,
que o forte orgulho resista:
de trabalhos e miséria
se alimente a rebeldia.

A Esp'rança, irmã da desgraça,
na treva silente, dá
coragem ao coração.
O grande dia virá.

Amor de amigo vos mando
além da porta sombria;
acorrentados aos catres,
ouvireis a melodia:

Grilhetas hão-de tombar,
muralhas desabarão.
E, na luz da liberdade,
vossa espada em vossa mão.

Sem Título - Paulo Leminski

Eu tão isósceles
Você ângulo
Hipóteses
Sobre o meu tesão

Teses sínteses
Antíteses
Vê bem onde pises
Pode ser meu coração

A Lua no Cinema - Paulo Leminski

A lua foi ao cinema,
passava um filme engraçado,
a história de uma estrela
que não tinha namorado.
Não tinha porque era apenas
uma estrela bem pequena,
dessas que, quando apagam,
ninguém vai dizer, que pena!
Era uma estrela sozinha,
ninguém olhava pra ela,
e toda a luz que ela tinha
cabia numa janela.
A lua ficou tão triste
com aquela história de amor
que até hoje a lua insiste:
— Amanheça, por favor!